Só quem já foi parte em um processo, seja como autor ou como réu, sabe o quão estressante e traumático ele pode ser, principalmente se restou vencido na ação.
Para tanto, é crucial escolher bem o advogado que irá defender seus interesses. Fique atento para aqueles profissionais que dizem: “é causa ganha”; “não tem como perder, fique tranquilo”. Essas afirmações são puramente de efeito, revelando ou medo de perder o cliente ou excesso de confiança. Evidentemente, nenhuma dessas será boa para você.
Nenhum advogado pode ser garantidor do resultado de uma ação judicial, na medida em que não será ele a pessoa responsável pelo julgamento. O juiz que avaliará as provas, ponderando as teses apresentadas, proferindo então a sentença. Aliás, na experiência prática, por vezes pode acontecer até de uma ação ser julgada improcedente ainda que o réu não tenha apresentado defesa.
Não por menos, o Código de Ética e Disciplina da OAB, no seu artigo 8°, estabelece que “O advogado deve informar o cliente, de forma clara e inequívoca, quanto a eventuais riscos da sua pretensão, e das consequências que poderão advir da demanda.”
Além de seguir a risca esse comando ético, o advogado tem de fazer uso de tudo aquilo que estiver ao seu alcance para tentar convencer o juiz. Para tanto, fará uso de teses jurídicas corretas, instruirá sua petição com todos os documentos disponíveis, buscará ouvir testemunhas, observará todos os prazos processuais.
É o que se denomina de “obrigação de meio”, ou seja, deve o advogado bem empregar seus conhecimentos e utilizar adequadamente todos os meios técnicos à disposição na busca do resultado, sem responsabiliza-se por ele.
Destarte, estimado leitor, se infortunadamente precisar contratar um advogado, avalie o profissional antes de assinar a procuração, considere o que ele diz sobre seu problema jurídico, se prometeu causa ganha, se mencionou os riscos da eventual demanda. Mas não só, avalie o prestígio do profissional na sua localidade (casos de sucesso) e sua formação acadêmica, sempre fatores muito importantes.
Agora, direcionando texto mais precisamente para aqueles que já estão familiarizados com o estudo do direito, passa-se a fazer alguns apontamentos sobre a responsabilidade civil do advogado.
Pois bem. De início, vale destacar o artigo 32, da Lei nº 8.960/94 (Estatuto da Advocacia), in verbis:
Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa.
Oportunos são os ensinamentos de Sérgio Cavalieri Filho no que tange ao tema:
- “Não é obrigado o advogado a aceitar patrocínio de uma causa, mas, se firmar contrato com o cliente, assume obrigação de meio, e não de resultado, já que não se compromete a ganha-lá, nem a absolver o acusado. A sua obrigação é defendê-lo com o máximo de atenção, diligência e técnica, sem qualquer responsabilidade pelo sucesso ou insucesso da causa. Consequentemente, não há presunção de culpa na espécie de responsabilidade, a despeito de ser contratual. O cliente só poderá responsabilizar o advogado pelo insucesso da demanda provando que ele obrou com dolo ou culpa. A lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994 (novo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), em seu art. 32, é expressa nesse sentido. Via de regra, a responsabilização do advogado, tal como em relação aos médicos, tem lugar nos casos de culpa grave (art. 34, IX) decorrente de erros grosseiros, de fato ou de direito, cometidos no desempenho do mandato, tais como o ajuizamento da ação inviável, desconhecimento de texto expresso de lei ou de jurisprudência dominante etc. ”
Portanto, como já mencionado acima, impositivo destacar a obrigação do advogado como de “meio”, e não de “resultado”. Logo, não se compromete pelo sucesso da causa, mas tão somente a defender o interesse da parte na demanda, com zelo.
Contudo, violará a boa-fé objetiva “o advogado que for omisso em defender o seu cliente, perdendo prazos ou não oferecendo manifestações que de forma mínima possam ser consideradas como defesa dos interesses do outorgante do mandato” (LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 371). Nesse sentido:
- DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AGRAVO RETIDO. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO DE CONHECIMENTO. DESCUMPRIMENTO. APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO. PERDA DE PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. NEGLIGÊNCIA CONSTATADA. APLICAÇÃO DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. DANOS MORAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO COM BASE NOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. […] 2. A responsabilidade do advogado na condução da defesa processual de seu cliente é de ordem contratual. E, ainda que não responda pelo resultado, o advogado é obrigado a aplicar toda a sua diligência habitual no exercício do mandato, sendo que ao perder, de forma negligente, o prazo para a interposição do recurso cabível ou protocolar recurso sem a observância dos requisitos obrigatórios, o causídico frustra as chances de êxito de seu cliente. 3. Demonstrada a manifesta negligência do advogado no cumprimento do mandato e na prestação dos serviços contratados, impõe-se a reparação pelos danos morais suportados. […] AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. RECURSO DE APELAÇÃO DA AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO DE APELAÇÃO DO RÉU CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR – 9ª C. Cível – AC – 1734768-7 – Curitiba – Rel.: Coimbra de Moura – Unânime – J. 30.11.2017)
Conforme ensina a doutrina, “a perda de prazo constitui erro grave. Por constar expressamente da lei, não se tolera que o advogado o ignore” (GONÇALVES, Carlos Roberto. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 281), de modo que, caso o ajuizamento intempestivo de uma ação judicial seja imputável ao procurador constituído pelos autores, deverá ele indenizar o cliente. Nesse sentido:
- APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO PELA PERDA DE UMA CHANCE E POR DANOS MORAIS. – CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS AJUIZADA EXTINTA PELA PRESCRIÇÃO. CONSTITUIÇÃO DO ADVOGADO COMO PROCURADOR PARA A PROPOSITURA DA DEMANDA EM DATA POSTERIOR AO TRANSCURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL. PERDA DO PRAZO PARA O AJUIZAMENTO DA CAUSA NÃO IMPUTÁVEL AO ADVOGADO. DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE. – INCIDÊNCIA DE HONORÁRIOS APELAÇÃO CONHECIDA E NÃO PROVIDA.RECURSAIS. – – Tendo em vista que quando os autores outorgaram a procuração para o ajuizamento da ação o prazo prescricional já havia se consumado, não é possível responsabilizar o advogado pela extinção da pretensão e a consequente perda de uma chance. (TJPR – 9ª C.Cível – 0000256-20.2016.8.16.0176 – Wenceslau Braz – Rel.: Juiz Rafael Vieira de Vasconcellos Pedroso – J. 14.03.2019) (TJ-PR – APL: 00002562020168160176 PR 0000256-20.2016.8.16.0176 (Acórdão), Relator: Juiz Rafael Vieira de Vasconcellos Pedroso, Data de Julgamento: 14/03/2019, 9ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/03/2019)
Outrossim, o STJ já entendeu pelo dever do advogado de indenizar seu cliente por perder prazo de contestar ou interpor recurso:
- “RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DANO MORAL. PERDA DE PRAZO POR ADVOGADO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. DECISÃO DENEGATÓRIA DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL NA QUESTÃO PRINCIPAL QUE ANALISOU AS PRÓPRIAS RAZÕES RECURSAIS, SUPERANDO A ALEGAÇÃO DE INTEMPESTIVIDADE. DANO MORAL INEXISTENTE. 1. É difícil antever, no âmbito da responsabilidade contratual do advogado, um vínculo claro entre a alegada negligência do profissional e a diminuição patrimonial do cliente, pois o que está em jogo, no processo judicial de conhecimento, são apenas chances e incertezas que devem ser aclaradas em juízo de cognição. 2. Em caso de responsabilidade de profissionais da advocacia por condutas apontadas como negligentes, e diante do aspecto relativo à incerteza da vantagem não experimentada, as demandas que invocam a teoria da” perda de uma chance “devem ser solucionadas a partir de detida análise acerca das reais possibilidades de êxito do postulante, eventualmente perdidas em razão da desídia do causídico. Precedentes. 3. O fato de o advogado ter perdido o prazo para contestar ou interpor recurso – como no caso em apreço -, não enseja sua automática responsabilização civil com base na teoria da perda de uma chance, fazendo-se absolutamente necessária a ponderação acerca da probabilidade – que se supõe real – que a parte teria de se sagrar vitoriosa ou de ter a sua pretensão atendida. 4. No caso em julgamento, contratado o recorrido para a interposição de recurso especial na demanda anterior, verifica-se que, não obstante a perda do prazo, o agravo de instrumento intentado contra a decisão denegatória de admissibilidade do segundo recurso especial propiciou o efetivo reexame das razões que motivaram a inadmissibilidade do primeiro, consoante se dessume da decisão de fls. 130-134, corroborada pelo acórdão recorrido (fl. 235), o que tem o condão de descaracterizar a perda da possibilidade de apreciação do recurso pelo Tribunal Superior. 5. Recurso especial não provido. (REsp 993.936/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 27/03/2012, DJe 23/04/2012)
Por fim, ainda é necessário mencionar sobre a responsabilidade do advogado quando do substabelecimento a outro profissional. Em regra, na hipótese de haver autorização para substabelecer, o mandatário não responde pelos atos praticados pelo substabelecido que venham causar danos ao mandante.
A exceção fica para o caso de restar comprovada a culpa “in eligendo”, que se dá no caso de o mandatário proceder a uma má escolha do substabelecido, recaindo sobre pessoa que não possui capacidade legal (geral ou específica), condição técnica ou idoneidade para desempenhar os poderes a ela transferidos.
A culpa “in eligendo” igualmente restará configurada se o substabelecente negligenciar orientações ou conferir instruções deficientes ao substabelecido, subtraindo-lhe as condições necessárias para o bom desempenho do mandato.
Esses apontamentos são todos retirados de entendimento do STJ:
- RECURSO ESPECIAL. DELIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DE ADVOGADO SUBSTABELECENTE POR ATO PRATICADO EXCLUSIVAMENTE PELO SUBSTABELECIDO, CAUSADOR DE PREJUÍZO AO CLIENTE/MANDATÁRIO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE VALOR PERTENCENTE AO CLIENTE PELO SUBSTABELECIDO, SEM NENHUMA DEMONSTRAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO DO MANDATÁRIO. CULPA IN ELIGENDO. A INAPTIDÃO DO ELEITO PARA O EXERCÍCIO DO MANDATO (EM SUBSTABELECIMENTO) DEVE SER UMA CIRCUNSTÂNCIA CONTEMPORÂNEA À ESCOLHA E, NECESSARIAMENTE, DE CONHECIMENTO DO SUBSTABELECENTE. NÃO CARACTERIZAÇÃO, NA ESPÉCIE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A controvérsia instaurada no presente recurso especial centra-se em definir se o advogado substabelecente (mantidos os seus poderes) responsabiliza-se solidariamente pelos prejuízos causados à cliente por ato ilícito praticado unicamente pela causídica substabelecida que deixou de lhe repassar os valores recebidos em razão de acordo, por ela subscrito, realizado entre as partes, o qual pôs fim à demanda. 2. Em regra, na hipótese de haver autorização para substabelecer, o mandatário não responde pelos atos praticados pelo substabelecido que venham causar danos ao mandante, salvo se for comprovada a sua culpa in eligendo, que se dá no caso de o mandatário proceder a uma má escolha do substabelecido, recaindo sobre pessoa que não possui capacidade legal (geral ou específica), condição técnica ou idoneidade para desempenhar os poderes a ela transferidos. A culpa in eligendo resta configurada, ainda, se o substabelecente negligenciar orientações ou conferir instruções deficientes ao substabelecido, subtraindo-lhe as condições necessárias para o bom desempenho do mandato. 2.1 Para o reconhecimento da culpa in eligendo do substabelecente, é indispensável que este, no momento da escolha, tenha inequívoca ciência a respeito da ausência de capacidade legal, de condição técnica ou de idoneidade do substabelecido para o exercício do mandato. 2.2 Compreender que o mandatário incorre em culpa in eligendo pelo fato de o substabelecido ter, durante o exercício do mandato, por ato próprio, causado danos ao mandante, a revelar – somente nesse momento – sua inaptidão legal, técnica ou moral, equivaleria a reconhecer, sempre e indistintamente, a responsabilidade solidária entre eles, o que se afasta por completo dos ditames legais. Logo, a inaptidão do eleito para o exercício do mandato (em substabelecimento) deve ser uma circunstância contemporânea à escolha e, necessariamente, de conhecimento do mandatário, a configurar a sua culpa in eligendo. 3. Afigura-se indiscutível que o advogado substabelecido que se apropria indevidamente dos valores pertencentes ao cliente, tal como se deu na espécie, ostenta absoluta inaptidão para o exercício dos poderes que lhes foram transferidos. Todavia, o advogado substabelecente somente irá responder por este ato ilícito se ficar evidenciado que, no momento da escolha, a despeito de possuir inequívoca ciência acerca da inidoneidade do aludido causídico, ainda assim o elegeu para o desempenho do mandato. 4. O substabelecimento, em especial, o com reserva de poderes, evidencia, naturalmente, a existência, entre as partes envolvidas (substabelecente e substabelecido), de uma relação calcada, minimamente, na confiança. Entretanto, essa relação prévia, por si, não é suficiente para vincular o substabelecente, a ponto de responsabilizá-lo por atos praticados pelo substabelecido que venham a desbordar dos poderes transferidos, a revelar sua inaptidão para o exercício do mandato. 4.1 A apropriação indébita de valores do cliente pelo advogado, que exerce, nos termos do art. 133 da Constituição Federal, função essencial à Justiça, consubstancia um ato antijurídico, absolutamente anormal, cuja prática não pode ser esperada (ou presumivelmente aguardada) pelo advogado que, devidamente autorizado contratualmente, pretenda substabelecer poderes a outro colega de profissão. 4.2 No caso dos autos, o acórdão recorrido não indica nenhum fato idôneo que sinalize ter o substabelecente obtido, ao proceder à escolha da substabelecida, ciência de que esta não ostentava idoneidade para o exercício do mandato, aspecto essencial à configuração da culpa in eligendo, tendo, na verdade, passado ao largo de qualquer consideração nesse sentido. Não houve qualquer cogitação, por exemplo, de que não seria a primeira vez que a causídica teria se apropriado indevidamente de valores de seus clientes, ou que respondesse a processos disciplinares perante a Ordem dos Advogados do Brasil por infrações éticas, etc, e, portanto, o substabelecente, ao elegê-la, pela responsabilidade que esse ato implica, saberia (ou deveria saber) de tais circunstâncias. 5. Recurso especial provido. (STJ – REsp: 1742246 ES 2018/0076749-0, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 19/03/2019, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/03/2019)