Tal como discutido em outro artigo, o desenvolvimento da Inteligência Artificial (IA) tem suscitado inúmeras questões controvertidas referentes à possibilidade de convivência entre máquina e o ser humano, motivo pelo qual também assume diversas formas de manifestação na experiência tecnológica propriamente dita e no imaginário coletivo.
De qualquer forma, reconhece-se que a temática não é atual, especialmente para os leitores de distopias literárias em que a humanidade não raramente se vê ameaçada pela criação de robôs humanoides. Talvez em razão desse suposto temor social, proveniente, em grande medida, dos ambientes construídos no contexto da ficção científica, sociedade civil e legisladores se sentem impelidos a agir para adotar medidas de precaução diante do novo cenário social e tecnológico que se apresenta.
Assim sendo, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 2.338/2023, que dispõe sobre a Inteligência Artificial (IA). Conforme prevê o art. 1º, tal medida legislativa tem por finalidade geral estabelecer “normas gerais de caráter nacional para o desenvolvimento, implementação e uso responsável de sistemas de inteligência artificial (IA) no Brasil, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais e garantir a implementação de sistemas seguros e confiáveis, em benefício da pessoa humana, do regime democrático e do desenvolvimento científico e tecnológico” (BRASIL, 2023, p. 2).
E, em justificação legislativa, argumenta-se que tal projeto tem duplo objetivo. Veja-se: “De um lado, estabelece direitos para proteção do elo mais vulnerável em questão, a pessoa natural que já é diariamente impactada por sistemas de inteligência artificial, desde a recomendação de conteúdo e direcionamento de publicidade na Internet até a sua análise de elegibilidade para tomada de crédito e para determinadas políticas públicas. De outro lado, ao dispor de ferramentas de governança e de um arranjo institucional de fiscalização e supervisão, cria condições de previsibilidade acerca da sua interpretação e, em última análise, segurança jurídica para inovação e o desenvolvimento tecnológico” (BRASIL, 2023, p. 30).
Sustenta-se, ainda, que, “Além de fixar direitos básicos e transversais para todo e qualquer contexto em que há interação entre máquina e ser humano, como informação e transparência, intensifica-se tal obrigação quando o sistema de IA produz efeitos jurídicos relevantes ou impactem os sujeitos de maneira significativa (ex: direito de contestação e intervenção humana)” (BRASIL, 2023, p. 30).
A partir de uma leitura geral do referido projeto, é possível verificar como o pretenso Marco Legal da Inteligência Artificial (IA) fora organização. Em síntese, por ordem cronológica de apresentação dos dispositivos, verificam-se: fundamentos (art. 2º), princípios (art. 3º), finalidades (art. 4º), direitos (arts. 5º a 12), categorização de riscos (arts. 13 a 18), governança dos sistemas de Inteligência Artificial (IA) (arts. 19 a 26) – com especial atenção para a avaliação de impacto algorítmico –, responsabilidade civil (arts. 27 a 29), códigos de boas práticas de governança (art. 30), comunicação de incidentes graves (art. 31), e supervisão e fiscalização (arts. 32 a 43).
Em uma sociedade diretamente influenciada por tecnologia e legisladores, a leitura do Projeto de Lei nº 2.338/2023 é tarefa inadiável, especialmente quando se parte do pressuposto de que “as previsões apontam que a inteligência artificial (IA) provocará mudanças econômicas e sociais ainda mais profundas num futuro próximo” (BRASIL, 2023, p. 28).
Por ora, novamente, resta-nos aguardar a tramitação da referida proposta legislativa.
Referência:
BRASIL. Projeto de Lei nº 2.338, de 2023. Dispõe sobre o uso da Inteligência Artificial. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9347622&ts=1684441712955&disposition=inline&_gl=1*1w0ni2g*_ga*MTMxNDExMjU1MS4xNjQ5NTM4ODMy*_ga_CW3ZH25XMK*MTY4NTgzMDk4MC42LjAuMTY4NTgzMDk4MC4wLjAuMA.. Acesso em: 11 jun. 2023.