Muito se discutiu recentemente sobre a censura das redes sociais, principalmente com o ataque do STF às atividades do Twitter (X) no Brasil e pelo cancelamento dos perfis das redes do candidato Pablo Marçal. Mas esse já é um problema relativamente antigo, também sofrido pelo Telegram, pelo influencer Monark e por diversos outros usuários que realizaram postagens que não agradaram o stablishment político. Mas afinal, por que censurar perfis em redes sociais seria um sério problema e qual seria uma possível solução?
Qual a utilidade das redes sociais e por que restringi-las é uma catástrofe?
Por mais tentador que isso possa nos soar em certos casos, ao defender a censura de perfis em redes sociais, estaríamos dificultando que ideias fossem apresentadas e discutidas de maneira livre, atrapalhando um processo de aprendizagem informal dos indivíduos. Ideias absurdas e sem sentido (como mencionou Monark) simplesmente seriam derrotadas por argumentos sólidos em um debate sério, permitindo que os espectadores também aprendessem com isso. Ter contato com ideias diferentes também faz parte do processo de amadurecimento dos indivíduos, e atrapalhar esse processo colabora para que as pessoas continuem infantilizadas e alienadas, tal qual as crianças mimadas e superprotegidas pelos pais.
Em seu artigo “O uso do conhecimento na sociedade”, Hayek (2013) nos apresenta a ideia de que “o conhecimento muitas das vezes é prático e está distribuído de forma informal entre os indivíduos em suas circunstâncias de tempo e espaço”. Cada indivíduo sabe muito mais sobre sua realidade (seja ela pessoal ou profissional) do que pessoas a milhares de quilômetros de distância. Logo, soaria ao menos arrogante acreditarmos que não teríamos absolutamente nada a aprender uns com os outros.
Com o surgimento das redes sociais, foi possível que pessoas distantes geograficamente pudessem estabelecer contato entre si, compartilhando informações e conhecimentos diversos. Apesar dos muitos problemas que também surgiram, como aqueles mencionados no documentário “O dilema das redes”, não podemos simplesmente descartar os inúmeros benefícios que o networking sem fronteiras nos proporcionou. Além disso, muito provavelmente possuímos mais afinidades com pessoas distantes de nós do que com nossos vizinhos e colegas de trabalho.
Esses perfis poderiam nos transmitir conhecimentos de seu domínio, anunciar seus produtos ou até mesmo compartilhar algumas duras realidades de seu cotidiano, com o intuito de buscar soluções. E sendo as redes sociais o meio mais amplamente utilizado e acessível para a maioria das pessoas, ao privarmos essas pessoas de apresentarem suas ideias, estaríamos privando milhares (se não milhões) de pessoas de adquirirem o conhecimento que muitas das vezes nem saberiam que existisse.
Os defensores da censura alegam que certos comentários podem estar “caluniando ou difamando um indivíduo”, podendo arruinar a sua “reputação”. O problema é que, segundo Walter Block (2010), seguir essa lógica implicaria em censurar até mesmo as críticas desfavoráveis, porém verdadeiras:
São abundantes as histórias cruéis sobre empregos, amizades etc., perdidos. Longe de se preocuparem com o direito de livre expressão do difamador e do caluniador, os libertários civis têm se preocupado em proteger aqueles que tiveram suas reputações destruídas, como se isso fosse, por si próprio, imperdoável. Mas, obviamente, proteger a reputação de uma pessoa não é um valor absoluto. Se fosse, ou seja, se as reputações fossem realmente sacrossantas, então teríamos de proibir a maior parte dos tipos de comunicação que podem denegrir a reputação de alguém, mesmo as verdadeiras. A crítica desfavorável e a sátira ao cinema, teatro, música ou a crítica literária não poderiam ser permitidas. Qualquer coisa que depreciasse a reputação de qualquer indivíduo ou instituição teria de ser proibida.
(BLOCK, W. Defendendo o Indefensável. 2. ed. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. p 67)
É importante frisar que nossa reputação não é algo que possuímos como propriedade. Tentar imputar penas legais em pessoas que “maculem a reputação de outrem” seria algo tão surreal como tentar controlar os pensamentos de outras pessoas:
Um homem não possui sua reputação, da mesma forma como não possui os pensamentos dos outros—porque isso é tudo do que consiste sua reputação. A reputação de um homem não lhe pode ser roubada, da mesma forma como não lhe podem ser roubados os pensamentos de outras pessoas. Se sua reputação “lhe foi tirada”, de um modo ou de outro, pela verdade ou pela falsidade, antes de tudo, ele não a possuía e, portanto, não deveria poder recorrer à lei por danos.
(BLOCK, W. Defendendo o Indefensável. 2. ed. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. p 68)
Além de tudo isso, se concedermos a um grupo de burocratas o poder para censurar aqueles que questionam suas ações, quais os incentivos que eles teriam para não abusar desse poder?
Como funcionam as redes sociais e o que são os terceiros de confiança?
Praticamente todas as redes mais utilizadas possuem servidores centrais (data center) e que são utilizados para armazenar todos os dados de seus usuários. Caso você perca sua senha de acesso, a equipe de suporte lhe enviará outra senha através do e-mail cadastrado. O mesmo também acontece com bancos e outros serviços centralizados. Para tanto, devemos depositar nossa confiança nesses intermediários que armazenam nossos dados e nos prestam algum suporte. Estes são conhecidos como terceiros de confiança.
O problema dos terceiros de confiança, segundo Nick Szabo (2001), é quando sua confiança é comprometida. Apesar de ser muito cômodo delegar certas prerrogativas a esses terceiros, eles mesmos estariam vulneráveis em casos de ameaças de burocratas estatais. Bastaram apenas alguns instrumentos burocráticos do poder judiciário ameaçando CEOs para que perfis de usuários fossem banidos e escritórios de redes sociais fossem fechados no país, sob pena de sanções.
Mas então qual seria uma possível solução para esse problema?
Da mesma forma que Satoshi Nakamoto criou um tipo de ativo digital descentralizado e ponto-a-ponto, o Bitcoin, cujo objetivo era oferecer uma solução para o problema do dinheiro fiduciário corrompido pelos bancos centrais, o brasileiro conhecido como “fiatjaf” criou uma rede social cuja arquitetura é muito semelhante: o Nostr. O próprio fundador do Twitter, Jack Dorsey, foi um grande contribuinte para o projeto.
O Nostr é um protocolo de rede descentralizado para um sistema de rede social distribuído. As postagens são resistentes à censura e são validadas criptograficamente. Sendo assim, é muito mais difícil que os usuários percam o acesso a suas contas, o que infelizmente está ocorrendo com maior frequência pelo mundo.
De maneira simplificada, o Nostr permite que os próprios usuários utilizem servidores (relays) descentralizados que eles mesmos podem criar. É justamente isso que torna a rede distribuída e sem um ponto único de falha.
O Nostr também permite que os usuários conectem suas carteiras de Bitcoin na Lightning Network, permitindo que recebam “satoshis” (frações de bitcoin). Para influencers e criadores de conteúdo acostumados a criticar o status quo, isso não seria má ideia.
Não apenas redes sociais, mas quaisquer aplicações que utilizem a arquitetura descentralizada em seu modelo de negócio serão muito mais resistentes a ataques de criminosos (políticos ou não). Além disso, novas oportunidades poderão surgir para empresas que desejarem se integrar a essas estruturas, aproveitando inclusive as vantagens de não depender exclusivamente de dinheiro fiduciário estatal (centralizado) para financiar suas operações.
Como utilizar o Nostr
Agora que a ferramenta já foi introduzida, colocarei neste outro artigo o passo a passo para abrir uma conta no Nostr.
Conclusão
Essa nova ferramenta nos faz refletir sobre como a repressão nos força a desenvolver e a aprender sobre novas tecnologias. Após o ocorrido no dia 30 de agosto de 2024, as pesquisas sobre VPN (Virtual Private Network) aumentaram significativamente no Brasil.
É importante que estejamos conscientes de que, ainda que não utilizemos determinadas redes sociais (como era o meu caso, em relação ao “X”), não devemos ser indiferentes em relação a essas decisões autoritárias. Tolerar esse tipo de decisão em silêncio é o primeiro passo na trilha do totalitarismo, pois serão abertos diversos precedentes para agir da mesma forma em casos posteriores.
Proibir a livre comunicação é o mesmo que impedir que as pessoas possam aprender e desenvolver networking. Tentar controlar o que os outros pensam de outrem (reputação) é o mesmo que acreditar na “polícia das ideias” da distopia orwelliana “1984”. Acreditar que um ser humano tenha o direito de legislar em favor disso é um forte sintoma de doença social.
REFERÊNCIAS
BLOCK, W. Defendendo o Indefensável. 2. ed. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010.
HAYEK, F. A. VON. Uso do conhecimento na sociedade. MISES: Revista Interdisciplinar de Filosofia, Direito e Economia, v. I, n. 1, p. 153–162, 2013.
SZABO, N. Trusted Third Parties are Security Holes. Satoshi Nakamoto Institute, 2001.
Artigo sensacional!!!
Sou sua fã numero 1!!!!!👏👏👏👏👏