Hodiernamente, costuma-se atribuir a qualidade de empresário a uma pessoa que tem um negócio, um comércio qualquer.
Mas legalmente falando, quando uma pessoa pode ser denominada como empresária?
O Código Civil tratou de regulamentar a matéria, mas para entender o que é um empresário, primeiro deve-se compreender o que vem a ser uma empresa, já que o diploma civil definiu o empresário a partir do conceito de empresa (art. 966), considerando-a como atividade dotada das seguintes características: economicidade, profissionalismo, organização e finalidade de produção ou circulação de bens ou serviços.
Destarte, empresa é uma atividade: i) econômica; ii) organizada; iii) profissional; iv) industrial, comercial ou de prestação de serviços. Conclui-se, portanto, que a natureza de empresa é, sobretudo, uma atividade, não podendo ser sujeito de direitos. Logo, do ponto de vista jurídico (por óbvio), não é correto utilizar-se de expressões como “tenho uma empresa”, ou “vou ali na empresa”.
Registre-se que não é qualquer atividade. Como dito, somente atividades econômicas interessam à caracterização da empresa. Isto é, aquela atividade voltada precipuamente para obtenção de lucro. A atividade deve produzir o suficiente para, pelo menos, remunerar os fatores da produção e, dentre eles, o capital investido, de molde a assegurar, por si mesma, sua sobrevivência.
Outrossim, a atividade econômica deve estar organizada – mas não no sentido coloquial da palavra. A atividade econômica está organizada quando ela detém os fatores de produção, isto é, força de trabalho/mão de obra, matéria-prima, capital e tecnologia. A ausência de qualquer um dos quatro fatores de produção descaracteriza a organização e, consequentemente, a pessoa jurídica como empresa.
O profissionalismo, por sua vez, deve ser entendido em sentido amplo, de molde a considerar toda aquela que não seja extemporânea, casual, improvisada. Além disso, exige-se qualificação técnica e aprimoramento.
Por fim, ela (a atividade) deve ser industrial, comercial ou de prestação de serviços porque é voltada ao mercado (atos de comércio), e não para o consumo próprio.
Nestes termos, uma vez delimitada (ainda que sinteticamente) o que é uma empresa, pode-se tranquilamente afirmar que empresário é a pessoa física que exerce empresa, podendo ou não associar-se a outras pessoas – quando será empresário individual ou uma sociedade empresária, respectivamente.
Vale destacar, por oportuno, que a própria sociedade é quem é empresária, e não os seus sócios. Isso porque é ela que organiza, em seu nome, a atividade de produção ou circulação de bens ou serviços. Assim, sócio de sociedade empresária não é considerado empresário, mas sim um empreendedor (quando, além de ter aportado capital, também colabora com seus próprios serviços) ou mero investidor (quando não participa).
Agora questão interessante pode ser indagada. Um dentista que abre um consultório, p.ex., pode ser considerado empresário? Nessa seara, o Código Civil fez uma ressalva, estabelecendo que os profissionais liberais não são considerados empresários (art. 966, parágrafo único).
Não obstante, se essa atividade do profissional liberal for tamanha que configure elemento de empresa, ela será sim empresária. Isso se dá quando a organização dos fatores de produção for mais importante que a atividade pessoal desenvolvida. Para explicar melhor, não há como não se valer das palavras de uma das maiores autoridades do país em direito empresarial, Fábio Ulhoa Coelho:
Há uma exceção, prevista no mesmo dispositivo legal, em que o profissional intelectual se enquadra no conceito de empresário. Trata-se da hipótese em que o exercício da profissão constitui elemento de empresa. Para compreender o conceito legal, convém partir de um exemplo. Imagine o médico pediatra recém-formado, atendendo seus primeiros clientes no consultório. Já contrata pelo menos uma secretária, mas se encontra na condição geral dos profissionais intelectuais: não é empresário, mesmo que conte com o auxílio de colaboradores. Nesta fase, os pais buscam seus serviços em razão, basicamente, de sua competência como médico. Imagine, porém, que, passando o tempo, este profissional amplie seu consultório, contratando, além de mais pessoal de apoio (secretária, atendente, copeira etc.), também enfermeiros e outros médicos. Não chama mais o local de atendimento de consultório, mas de clínica. Nesta fase de transição, os clientes ainda procuram aqueles serviços de medicina pediátrica, em razão da confiança que depositam no trabalho daquele médico, titular da clínica. Mas a clientela se amplia e já há, entre os pacientes, quem nunca foi atendido diretamente pelo titular, nem o conhece. Numa fase seguinte, cresce mais ainda aquela unidade de serviços. Não se chama mais clínica, e sim hospital pediátrico. Entre os muitos funcionários, além dos médicos, enfermeiros e atendentes, há contador, advogado, nutricionista, administrador hospitalar, seguranças, motoristas e outros. Ninguém mais procura os serviços ali oferecidos em razão do trabalho pessoal do médico que os organiza. Sua individualidade se perdeu na organização empresarial. Neste momento, aquele profissional intelectual tornou-se elemento de empresa. Mesmo que continue clinicando, sua maior contribuição para a prestação dos serviços naquele hospital pediátrico é a de organizador dos fatores de produção. Foge, então, da condição geral dos profissionais intelectuais e deve ser considerado, juridicamente, empresário.”
O objetivo desse texto foi apenas deixar claro daquilo que se considera, juridicamente, empresa e empresário. É tema para outro momento estabelecer os requisitos de regularidade do empresário bem como as responsabilidades.
Referências:
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. São Paulo: Método, Rio de Janeiro: Forense, 2018.
MELLO FRANCO, Vera Helena. Manual de direito comercial. 2. ed. São Paulo: RT, 2004