A indignação da população diante de tantos desmandos e medidas ditatoriais do Poder Executivo ocorre no Brasil inteiro, mas essa “revolta” poderia gerar uma situação revolucionária? Observando a História, para a substituição de um sistema por outro, os quadros e as novas organizações já devem existir e funcionar paralelamente ao sistema vigente. Não basta demonstrar indignação, é preciso muita organização.
Vejamos o exemplo do século 19: as revoluções sempre foram seguidas de contrarrevoluções, em uma espiral sangrenta e povoada de mártires, mas com efetividade limitada e a longo prazo. A Revolução Francesa e as Guerras Napoleônicas, de 1789 a 1815, introduziram constituições na Europa que romperam a hegemonia das famílias tradicionais. Entretanto, com a derrota de Napoleão, veio a Contrarrevolução. O Congresso de Viena restabeleceu a antiga ordem das famílias reinantes, em países invadidos e na própria França, com a dinastia dos Bourbon.
A segunda revolução ocorreu em 1848, fruto da insatisfação popular com a crise econômica em vários países da Europa. A demanda vinha de um caldeirão de novos atores: socialistas, burgueses, liberais, nacionalistas que reivindicavam mais participação política, mais liberdades individuais e inclusão. A ela sobreveio outra contrarrevolução, pois alguns monarcas incorporaram os anseios do povo e recuperaram sua popularidade, ao garantirem o consenso de que era melhor viver a ordem sob o comando da monarquia tradicional do que o caos sem limites das multidões. Embora os levantes revolucionários tenham determinado mudanças políticas na forma, foi a batuta do Estado que comandou o ritmo e o compasso dos conteúdos implementados.
No século 20, os levantes populares passaram a representar políticas de forças maiores, mais eficazes, pois contaram com financiamento, agenda, método e apoio de governos e instituições. E foi por esse motivo que a vontade popular serviu de bucha de canhão para outros interesses: a Revolução Russa em 1917; a Revolução Chinesa, financiada e apoiada pela União Soviética, ambas comunistas; e seguem na mesma cartilha revoluções que ocorreram na Coreia, Cuba, Vietnã, Nicarágua e outros.
No Brasil, durante todo o século 20, a esquerda internacional e países aliados a ela influenciaram políticas públicas e ajustes nas constituições que tivemos durante a república. No início do século 21 esse domínio continuou com presidentes revolucionários. A diferença é que a reação da população, evidente nas manifestações que depuseram a revolucionária Dilma do poder, abalou os alicerces da confortável posição dos esquerdistas.
Eles, que se vangloriavam de liderar historicamente as mobilizações populares, agora eram os fascistas opressores contra a população. Os levantes populares contra o sistema hoje não contam mais com financiamento de governos externos, nem mesmo apoio de organizações mundiais, com agenda política e método coeso como da esquerda no século 20. Portanto, os levantes do século 21 se assemelham aos do século 19: são autênticos, mas ao mesmo tempo ineficazes para a derrubada do sistema e do regime.
O polo se inverteu e a narrativa da esquerda libertadora se esgotou. Agora a direita precisa aprender com a História. Apesar de os levantes populares estarem em desvantagem diante de tantos mecanismos do poder do estado, no século 19 eles geraram impasses e resultados que colhemos até hoje. Esse conhecimento deve pautar nossas decisões e ações no presente.