Olá leitores!
Primeiramente quero deixar aqui comunicado a minha alegria e contentamento ao ser convidado para este projeto, no qual encontrei inspiração para começar minha própria produção nas redes e que agora posso dizer satisfatoriamente que faço parte e conto com a parceria de grandes intelectuais para juntos endossarmos a boa mensagem!
Como nos ensina Aristóteles: o conhecimento e a prática nas virtudes nos legarão sucesso em todas as esferas da existência humana, tendo como base a educação nas virtudes alcançaremos à ética que praticada como a justa medida nos legará ao bom viver, feliz viver como sociedade.
Em suma deixo aqui o meu agradecimento pelo convite e convido você leitor a nos acompanhar nessa missão de buscarmos a episteme, o bom saber, o saber virtuoso!
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Para minha estreia no instituto Saber Virtuoso, escolhi um tema que além da grande relevância filosófica que possui, devido a seu peso na historiografia não só da filosofia, mas posso dizer, das ciências humanas no geral, é também, ainda hoje um debate aberto que atrai atenção de todos aqueles indivíduos que olham para própria existência de maneira mais profunda.
Vou procurar abordar essa questão na espécie de um diálogo entre o grande romancista russo: Fiódor Dostoievski e alguns gigantes da filosofia ocidental.
No romance Os Irmãos Karamazov de 1879, o personagem Ivan Karamazov no ímpeto de sustentar sua filosofia niilista em determinado momento diz: “Se Deus não existe, então tudo é permitido.” Essa sentença tem um peso muito maior do que uma rebeldia de um acadêmico.
Immanuel Kant, filósofo alemão que viveu e produziu sua importantíssima obra no século XVIII, busca separar as ideias divinas da investigação filosófica que ele considerava como cientifica, no que diz respeito a investigação do mundo natural, argumentado que ideias como existência de Deus eram inacessíveis a razão humana e que mesmo que o ímpeto dessa razão fosse buscar essas ideias, por ela não seria alcançada. Esse ponto é o que ficou conhecido como a sua crítica a razão pura.
Contudo quando Kant redireciona sua investigação do mundo natural para o mundo do comportamento humano e com isso quero dizer para o campo da moral, ele atribui novamente o valor as ideias divinas.
O autor argumenta que a nossa moral é conduzia pela faculdade da razão prática, que nos regula enquanto pessoas, cidadãos e nasce de um ímpeto existencial em nossos corações, de reconhecermos a justiça em nós e o direito a mesma justiça ao próximo, modo de agir este que Kant chamou de imperativo categórico.
Para Kant, nós temos o dever de agir com justiça a todo e qualquer ser humano pois reconhecemos neles os mesmos direitos que há em nós, o que é conhecido como o princípio da dignidade humana.
Ainda nesta seara, Kant discorre a respeito de que um ser humano aqui, que tivesse vivido sua vida toda pautada pelo imperativo categórico, ou seja, exercendo justiça com os demais pelo simples dever e ainda fosse em vida prejudicado, seria este justificado na outra vida, pois para Kant, não é justo que aquele que aqui aja demostrando justiça, não tenha justiça também como retribuição.
Essa noção kantiana pode ser expressa na frase do autor: “duas coisas são claras para mim: a lei moral em meu coração e a lei divina a cima de mim.”. Percebemos aqui então que Kant faz a fundação de sua argumentação moral em uma argumentação teológica, da própria moral de Deus.
De volta a Ivan Karamazov, a afirmação de que Deus não existe e por consequência a moralidade também não, implica em uma tentativa de derrubar este edifício metafísico, contudo, é outro filósofo alemão que abalou as estruturas da fé na modernidade sob risco de instaurar o completo niilismo na sociedade.
Friedrich Nietzsche foi um filósofo alemão que viveu no século XIX, sua importância a filosofia se dá de maneira antagônica a muitos padrões, dentre eles: religiosos, morais, científicos e até mesmo, filosóficos. Foi um ferrenho inimigo do cristianismo e um grande crítico da própria noção de moralidade.
Nietzsche trilha sua filosofia através de uma noção anticonceitual, por mais que pareça contraditório e de fato pode ser mesmo, argumentando que a cultura grega antes de Sócrates era mais pungente pois tinha-se equilíbrio entre prazer(carnalidade) e razão(intelectualidade), que ironicamente conceitualiza com apolíneo e dionisíaco, em referência a um suposto equilíbrio entre os deuses gregos Apolo e Dionísio.
Nietzsche culpa a Sócrates e Platão (considera os dois como um só na filosofia), por uma espécie de “ditatura” da racionalidade, massacrando a dimensão do prazer(emocional) em detrimento de uma racionalidade, que utiliza a linguagem conceitual, linguagem esta que se perpetua através de antagonismo de conceitos, que para o autor, é a causa do decaimento cultural ocidental.
O antagonismo mais criticado por Nietsche é justamente as noções conceituais de bem e mal que regulam a noção de moralidade. Nietzsche ainda avança contra o Cristianismo, argumentando que os cristãos tem na metafísica de Platão o modelo perfeito para perpetuar essa filosofia, separando os mundos: físico (material e ruim) e o paraíso (imaterial, sumo bem), legando ao cristão uma vida de escravo na terra, tendo de se abster de prazer em detrimento a uma salvação que pode acontecer como também não pode.
Nietzsche chega a dizer que o Cristianismo perpetua uma moral do escravo na sociedade e ataca os cristãos dizendo que eles são os verdadeiros niilistas, pois abandonam o que vem e abraçam o que não podem ver. Além de pretensiosamente afirmar a morte de Deus.
Acompanhando ainda a escalada no pensamento Nietzschiano, ele cunha o que talvez seja o seu mais conhecido conceito: O Übermensch ou Super Homem. De acordo com seu raciocínio o super homem emergiria na sociedade, desprovido de noções como bem e mal, moral ou imoral, com uma capacidade de autorregulação de suas próprias noções éticas, livres para agir conforme suas vontades. Este mesmo Ser na mente de Nietzsche seria o próximo passo da sociedade humana.
Creio que nesse momento já ficou evidente a relação do pensamento de Ivan Karamazov e Nietzsche não é mesmo? Acontece que Nietzsche não testou sua própria teoria ao extremo, mas Ivan Karamazov, esse sim testou!
Acontece que no romance Os Irmãos Karamazov, as ideias relativistas, ateias e niilistas de Ivan tem um desdobramento em um terrível crime, que abala a sociedade e gera sequelas psicológicas em todos os personagens centrais da trama e ao contrário do que esperava Ivan, ele não estava acima do bem e do mal, pelo contrário, é açoitado pelo sentimento de culpa e se vê em verdadeiro sofrimento pelo mal ocasionado e que tinha encontrado forças nas suas ideias.
Importante ponto para nossa análise aqui é o fato de que o Ivan, em vários momentos durante a obra, parece ter suas convicções abaladas. Uma espécie de dúvida sobre seu próprio niilismo e ateísmo, mostrando “quase” reconhecer uma moralidade, mas sem aceitá-la.
Dito isso, convido o leitor a acompanhar o pensamento do filósofo dinamarquês e pai do existencialismo: Sören Kierkegaard, também no século XIX.
Ao estudar as condições da existência humana, Kierkegaard, divide a mesma em três fases: estética, moral e religiosa.
Lembremo-nos que estética é um termo que deriva do grego: aisthisi que significa: sensação. Neste primeiro estágio o indivíduo vive de acordo com as suas vontades momentâneas, algo parecido com o tipo de vida do super homem nietzschiano e o niilismo proposto por Ivan Karamazov, mas que eventualmente cobrará seu preço com um vazio existencial, pois a longo prazo não se tem satisfação real.
No segundo estágio, o moral, os indivíduos começam a viver os dilemas morais e começar atribuir esses valores éticos as suas ações, de certa maneira começa a viver pensando no valor de suas ações e seus limites e não mais pelo puro contentamento e prazer.
O terceiro estágio chamado por Kierkegaard de estágio religioso é quando o ser humano volta a sua existência para Deus, aceitando a ideia transcendente do divino, compreendendo seus princípios morais mais intrínsecos e acabando com as dúvidas, ansiedades e angústias que os outros estágios existenciais legavam ao mesmo. Podem vocês perceber que Kierkegaard vai no sentido oposto ao de Nietzsche.
O que podemos perceber é que Ivan vive uma tentativa falha de evoluir do estágio estético para o estágio moral, tentando encontrar o sentido da moralidade, porém rejeitando a ideia de Deus por completo, e a rejeitando, ele não encontra aquela base, aquele alicerce que sustente seu arcabouço moral, este alicerce que Kant encontrou também na ideia de Deus, sobrando a ele a angústia do niilismo.
Não só em Ivan Karamazov, mas também Raskolnikov em Crime e Castigo e Nikolai Stavróguin em Os Demônios, Dostoiévski nos entrega personagens que são intelectualmente desenvolvidos, mas que rejeitam a fé em Deus, a ideia de Deus e junto a isso, abraçam uma ideia niilista, um relativismo moral, mas que ao experimentar a prática de tais ações, são carcomidos pela culpa, sofrimento e sentem em si mesmos o peso da imoralidade, são de maneira contumaz, consumidos pelo seu próprio niilismo.
Encerro essa reflexão de maneira a defender que embora diversos pensadores se articularam filosoficamente para conceitualizar a moral, primeiramente experimentaram tão noção em si mesmos, ou, a falta dela em determinados casos.
O que Dostoiévski nos mostra é que nossos maiores esforços para sustentar a ideia de uma moral, não é nada a mais do que apenas apontar para ela, que basilarmente existe em inerência a nossa existência, haja visto que aqueles que a rejeitaram e contra ela atentaram, ao cabo sofreram por ela da mesma maneira.
Essa moral para qual apontamos, e mesmo com suas imperfeições buscamos nela se balizar é reflexo da moral universal, perfeita e incorruptível, a própria moral de Deus.
Referências bibliográficas:
Fiódor Dostoiévski – Crime e Castigo.
Fiódor Dostoiévski – Os Demônios.
Fiódor Dostoiévski – Os Irmãos Karamazov.
Immanuel Kant – A crítica da razão prática.
Immanuel Kant – A crítica da razão pura.
Frederich Nietzsche – A genealogia da moral.
Frederich Nietzsche – A Gaia Ciência.
Frederich Nietzsche – Assim falou Zaratustra.
Frederich Nietzsche – O crepúsculo dos ídolos.
Sören Kierkegaard – O conceito de Ironia.