- No filme “O gato de botas”. O personagem Humpty é um ovo que na infância era o melhor amigo do gato e que por um carácter ruim sempre teve vontade de vingança. Quando adultos os caminhos do Gato e de Humpty se cruzam novamente. Humpty convence o Gato, através de seu testemunho que existam ovos de ouro a no final de um pé de feijão gigante (fazendo uma alusão a história do João e o pé de feijão).
- A escolha deste personagem como analogia ao artigo se dá pela capacidade de fazer um testemunho ter validade de verdade e conhecimento. Entretanto a vontade real de Humpty não era pegar os ovos de ouro, mas sim destruir toda a cidade em que viveu em sua infância, utilizando-se de uma gansa gigante (monstro do filme, que inclusive solta fogo) para cumprir seu propósito.
- Por isso a dúvida se faz tão importante, caso o Gato a tivesse mantido, provavelmente não teria caído em tamanho problema a ponto de quase destruir sua cidade natal, por confiar em um testemunho de uma pessoa que não merecia confiança.
- Desta forma temos, então, que o testemunho de Humpty, não era de todo verdadeiro, pois a intenção que tinha por trás do testemunho o invalidava, até porque dizia ele ser seguro pegar os ovos e levar para sua cidade, o que ao final do conto fica comprovado como mentira.
Já duvidou de algo que era mais do que provável de verdadeiro do que falso? Isso não te torna uma má pessoa, ou errado, apenas demonstra seu ceticismo.
Ser cético é, inicialmente, não aceitar a verdade como pronta. Há sempre uma dúvida que poderá alterar o que se conhece.
Aquele que não duvida não aprende. Sem a dúvida não há propensão ao conhecimento. Aceitar algo pelo simples fato da aparência de ser não é o caminho para a verdade, mas o inverso.
A aparência que temos de o Sol estar em movimento e não a Terra não comprova que o Sol esteja em movimento e a Terra esteja parada. Fato é que a o Sol não se move ao redor da Terra, e sim a Terra ao redor do Sol. Logo a aparência de verdade não passou de uma mera ilusão de ótica.
Não há como descartar que os sentidos são ótimas fontes de conhecimento, mas eles podem captar, por muitas vezes, apenas a aparência e não a realidade.
Já citei algumas vezes Kant e farei novamente. Para este grande mestre, a verdade não é imutável, aquilo que já foi verdade poderá não mais o ser amanhã.
Karl Popper, em linhas diferentes, mas que levam a conclusão similar a de Kant, afirmando que premissas, teses, teorias e preposições, são válidas até provadas em contrário. Por conseguinte, uma premissa que hoje pode ser considerada como verdade terá o mesmo destino amanhã? Uma premissa não pode ser descartada sem que seja refutada, portanto ignorá-la não a torna menos provável de ser provada real, demonstra apenas o medo em descobrir a verdade.
Com a dúvida é possível formular premissas, teses, teorias e preposições, as quais quando não sanadas, seja por meio de sua confirmação ou invalidação, continuarão a manter a incerteza, mantendo a dúvida no ar.
Não se diz a uma criança que algo é porque é pelo simples fato de ser. Será muito provável que ela não aceita a verdade que lhe foi imposta. Então, para conseguir persuadi-la a uma verdade será utilizado algum mito, entretanto um mito que para ela seja plausível. Ainda, nada disso terá uma validade eterna para esta criança, tão logo ela cresça dúvidas novas às verdades antigas irão surgir.
A verdade pode nos ser cognoscível por várias formas, contudo vou abordar apenas umas, que é a mais pertinente na atualidade: O testemunho.
Testemunho
O testemunho nada mais é do que uma pessoa que relata algo que vivenciou ou diz ter vivenciado e, portanto, acredita ser verdade ou quer afirmar que assim seja.
Por meio do testemunho dado caberá ao ouvinte acreditar ou não. O testemunho terá mais peso, mais probabilidade de receber crédito, caso aquele que testemunhe seja uma autoridade naquilo que diga, ou até mesmo uma autoridade propriamente dita (nos termos da lei).
Passemos então a análise de relevância da autoridade que testemunha e seu testemunho:
- Testemunhante é aquele que faz o testemunho, que dá seu relato.
1 – O testemunho é passível de confirmação?
2 – Caso não seja possível comprovar, qual seria a probabilidade de o testemunho ser verídico?
3 – O testemunhante possui alguma credibilidade?
4 – Qual o tipo de autoridade atribuída ao testemunhante?
5 – Caso seja autoridade legal, por via de lei, como se dá sua conduta?
6 – Em sendo autoridade acadêmica qual sua relevância?
7 – O testemunho pode conter algum detalhe escuso?
Estas são apenas algumas das questões que podem e devem ser feitas para dirimir qualquer problema quanto ao testemunhante e o testemunho.
Contudo, não é qualquer dúvida que terá a capacidade de invalidar um testemunho, quando mais aquele que se tem por locutor é uma autoridade. Entretanto, isso não pode ser o suficiente para que a dúvida seja ignorada, por mais simples que seja.
O testemunho, essencialmente, tem de ser eloquente e esclarecedor caso contrário de nada adianta dizer a verdade. O sentimento de confiança é obrigatório para dar validade ao testemunho. A autoridade terá de deixar exalar o perfume da confiança, caso não o faça é provável que não convença o ouvinte.
Outro fato sobre a verdade é que de nada adianta o testemunhante utilizar-se da força, isso não fará com que o testemunho seja verdade, mas fará com que o ouvinte tenha mais motivos para desconfiar.
A única verdade que, talvez, possa ser demonstrada através da força é a própria força. Logo é improdutivo tentar usá-la senão para o próprio fim de demonstrá-la.
Aceitar a dúvida para saná-la
Após a aceitação da dúvida será possível formular outras teses, preposições, premissas ou teorias que tenham a capacidade de sanar a dúvida.
Repito, sem que a dúvida seja dirimida ela persistirá e poderá ter a capacidade de converter mais pessoas ao estado de dúvida. A própria dúvida tem a capacidade de gerar mais dúvidas, criando um efeito em espiral que a cada volta só se agrava, até chegar ao ponto onde a dúvida será tomada como verdade.
A verdade tem força quando demonstrada, a dúvida ganha força enquanto a verdade não aparece. Porém tão a luz da verdade seja visível a escuridão que paira sobre a dúvida irá começar a se discipar.
A dúvida nada mais é do que aquilo que precisa ser iluminado. A luz mostrará o caminho. Logo a dúvida se faz objeto da razão.
Parabéns….mais uma matéria excelente.
Muito bom!
Parabéns pelo artigo.